Por mais que passe o tempo, e que alcance tudo que antes fora apenas uma ambição, fica o passado, ainda na forma de uma ferida aberta, que não vê a hora de se cicatrizar.

Admito que, por mais que reveja e analise as minhas próprias escolhas, não encontro o ponto de viragem.

Não é que exista em mim uma sede constante de vingança, ou uma ira irremediável. Não reconheço ambas em mim, por mais que acredite que tenho direito a essa mesma vingança. Talvez seja só esse pensamento, e a ira que a injustiça foi criando em mim, que me trouxeram ao local onde estou hoje.

Talvez foram as memórias dos dias gelados e do abandono, da fome e do medo, que se compactaram na fonte do meu maior problema. E, ao torná-lo físico, e atentando contra a representação de tudo aquilo que me feriu e de tudo aquilo que simultaneamente abomino e desejo, que me entreguei a esta condeção eterna. O segundo em que a ira me tomou, e me tornou numa pessoa diferente. O segundo que mudou a pessoa que conheci e que construí. Agora, a ira que sentia pelo mundo, se estendeu a mim mesma, multiplicando-se exponencialmente, como se ela mesma atuasse como o seu proprio catalizador.

E não resta arrependimento.